sábado, 23 de julho de 2011

Doença de professor

Wilson Correia

“Diante do fenomenal e incontestável impacto positivo que tem a educação na vida de quem dela se beneficia, cumpre-nos cuidar daquele que é, paralelo a família, o principal agente mediador deste processo: o educador. Precisamos resgatar seu valor institucional em nossa sociedade, reivindicar melhores salários e condições de trabalho, demonstrar mais carinho, respeito e reconhecimento por este profissional pelo qual todos os outros, de engenheiros a advogados, de médicos a astronautas já passaram por ele” (Chafic Jbeilli*).

Milito na área da educação escolar, não na da saúde. No entanto, tenho lido e observado várias situações nas quais os professores despontam como os doentes da vez. E um mal que tem sido verificado e debatido mais amiúde (que não afeta apenas os professores, é óbvio) é a “síndrome de burnout” (“queimar de dentro para fora”, “esgotar-se de dentro para fora”).
Sumariamente falando, trata-se do mal provocado pelo estresse crônico que acomete o profissional do magistério por ele lidar com gente, atuar em meio a situações que envolvem fatores emocionais e se ver, diuturna e intensamente, responsável pelo enfrentamento de carências, necessidades, dificuldades e problemas dos meios social, institucional e humano nos quais exerce a docência. Segundo Chafic Jbeilli*, essa síndrome “Inicia-se com o desânimo e a desmotivação com o trabalho e pode culminar em doenças psicossomáticas, levando o profissional a faltas frequentes, afastamento temporário das funções e até à aposentadoria, por invalidez”.
A cartilha de Chafic (aqui referenciada) pode ser lida por quem busca informações mais aprofundadas sob a ótica da área da saúde. A mim me preocupa, aqui, o aspecto antropossocial e institucional desse problema.
Sabemos que a escola não é uma ilha, tanto quanto professor, estudante e demais membros da sociedade. Os problemas verificados na base das estruturas da sociedade afetam a todos, indistintamente. O professor e a professora estão sofrendo em cheio com essas mazelas porque nas mãos deles vão parar as crianças sobre as quais família e sociedade parecem ter perdido a autoridade.
Fenômenos que campeiam a sociedade, tais como injustiça social, individualismo, perda da noção sobre o valor do bem comum, abandono dos novatos porque os adultos estão matando seu leão cotidiano e, principalmente, a violência física e simbólica são algumas das encrencas amargas com que deparam os profissionais do magistério, diuturnamente.
Do lado de dentro das instituições de ensino vigoram os esquemas desumanos e medíocres de articulação de saber e poder, os quais acabam gerando “consensos” arbitrários que também violentam o professor e a professora. Em nome da tal “construção coletiva”, impõe-se interesses de grupelhos que só se dedicam a obter cargos e mais cargos. E, do alto dos próprios umbigos, vão sendo “alocados” a torto e a direito, não importando se a competência requerida acompanha os pequenos tiranos de nossas instituições de ensino.
São esses “senhores do cargo” que perpetram a mais espantosa das violências contra os pares, com destaque para as perseguições explícitas ou veladas. As coisas que eles manejam muito bem são a ironia, o sarcasmo, a tirada de tapete, a arrogância legalista, a fofoca e total falta de noção sobre o que, em termos de ética e etiqueta, cabe a quem se dedica à tarefa de educar. Poderá haver coisas mais tóxicas e contrárias às boas condições de saúde dos professores do que isso? Valores essenciais a quem educa, tais como sinceridade, sensibilidade, apego ao que é correto, justo e mais próximo da verdade passam longe do cotidiano dos professores que se encontram nesse tipo de circunstância.
Esses grupelhos tratam o bem comum como se privado fosse e se assenhoreiam de nacos sobre nacos de espaços públicos que, a bem da verdade, deveriam ser tratados como parte do bem comum, daquilo que não é de ninguém por ser de todos nós. Perdendo a noção sobre o que é público e supervalorizando o setor privado da vida, abrem-se as brechas para que as relações interpessoais dentro das instituições educativas se tornem um verdadeiro inferno. A toxicidade estrutural e conjuntural não dá em outra coisa: é doença na certa!
Nesse contexto, quando problemas estruturais e conjunturais da sociedade se cruzam com problemas institucionais, não há saúde de professor que possa aguentar. Já não é hora de a rede de instituições sociais parar de fazer vistas grossas para essa problemática e começar a envidar esforços no sentido de realizar as soluções necessárias ao enfrentamento desse mal?


__________
* JBEILLI, C. “Burnout em professores: identificação, tratamento e prevenção”. Disponível em: <http://www.saudedoprofessor.com.br/Burnout/Arquivos/cartilha.pdf>. Acesso em: 22.07.2011. Fontes das imagens: chacomsig.blogspot.com & dignow.org

Nenhum comentário: