quarta-feira, 27 de julho de 2011

Ismália: o caso dos servidores das IFES

Wilson Correia

O capitalismo leva mesmo a sério o lema “Dividir para governar”. Fazer justiça no que respeita à produção e apropriação da riqueza material é o que menos importa. Os servidores das IFES que o digam.

Hoje, o Brasil deixou de ser visto pelo mundo como um país pobre. Fala-se em “Brasil-potência”, “grande”, “rico”. Talvez nosso país esteja, na verdade, para uma Ismália: mistura de Islândia, primeiro IDH do mundo de 2011, com Somália, país que encontra-se às voltas com a morte por conta da fome que afeta milhões de pessoas.
Na Ismália o capital segue ativo e operante. Sua lógica baseada no lucro e na acumulação (à custa da expropriação) permanece alimentando a injustiça e alquebrando a liberdade. Só para ficar em alguns casos mais visíveis, é bom lembrar que:
1 Na Ismália a educação não é prioridade. Há quase dois meses de greve dos trabalhadores técnico-administrativos das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) -que parece um bom negócio para o governo porque com tudo parado as despesas com custos também deixam de correr- o governo não dialoga consequentemente com os grevistas. A política da “rolagem da greve” leva a reuniões para marcar outras reuniões e, assim, os servidores técnico-administrativos das IFES continuam sem entender a razão pela qual recebem pouco mais de 1 (um) mil reais mensais enquanto um motorista do judiciário ganha 7 (sete) mil reais por mês. E o caso dos professores e professoras, como estamos constatando todos os dias, não é diferente.
2 Na Ismália o piso salarial dos professores federais é inferior ao piso salarial dos ensinantes estaduais. Não há qualquer preocupação com a isonomia nesse setor e, justamente pelo fato de a educação não ser prioridade, a “rolagem” da situação também violenta os docentes. Não é sem motivo que dias atrás, em Maringá, no Paraná, os representantes das universidades federais decidiram reforçar a luta salarial de 2011, seguindo os técnico-administrativos, os quais optaram por continuar o movimento paredista que sustentam a quase 60 dias.
3 Na Ismália, pelo fato de a educação não ser prioridade, embora o Estado seja o responsável por gerir a riqueza material produzida (essa que deveria ir para os cofres do bem comum, da coisa pública e destinada a setores estratégicos como saúde, segurança e educação, visando a garantir direitos) esse mesmo Estado tem o desplante de oferecer 4 (quatro) bilhões a um único empresário para que ele incremente seu lucro e acumulação individual, justamente no momento em que se nega a ceder e fazer-se um pouco mais humano com os servidores da educação.
4 Na Ismália os professores (que convivem com uma lei salarial injusta) ainda estão sendo ameaçados de terem seus vencimentos congelados por dez anos, tudo para economizar 50 bilhões “a qualquer custo”, mesmo que isso ceife a vida de muitas pessoas por falta de saúde, segurança e, indiretamente, de educação, longe, pois, do melhor posicionamento democrático e republicano.
Creio que esses exemplos bastam por ora. Qualquer estudo mais aprofundado mostrará facetas inomináveis dessa excrescência chamada injustiça, na qual os trabalhadores da educação estão sendo mantidos, também “a qualquer custo”. É fato que o Estado da Ismália não leva em conta que a produção e a distribuição de riqueza podem e devem seguir regras justas e equinânimes.
Tanto que, nos últimos tempos, graças ao trabalho dos ismalienses não estacionados na condição de parasitas ou de fruidores de privilégios, houve certa melhoria nos indicativos sobre disparidades salariais. Entretanto, não se sabe ao certo a quantas anda a desigualdade entre quem tem apenas a força de trabalho (salário e benefício social) e quem dispõe de outros tipos de bens e pode se valer de diversas rendas (aluguéis, lucro, juros e aplicações no mercado financeiro).
O capital segue voraz e implacável nessas plagas. Na Ismália o lucro e a acumulação propiciadores de estilos de vida regados a luxo e desperdício são mantidos mediante o sanguessuguismo que também perpetra a desigualdade, a fome e a morte. Nisso os professores e técnico-administrativos das IFES parecem mais do que preparados para compreender. Por isso eles podem ensinar essa mazela, já que essa é uma lição que estamos escrevendo em nossa própria carne.

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